Quem são os seguidores de Jordan Peterson?

Porque é que figuras como Jordan Peterson reúnem cada vez mais adeptos? “Quem o segue são pessoas inseguras e vulneráveis com necessidade de pertença a um grupo”. Quem faz esse tipo de críticas superficiais, consideradas muito sagazes, são pessoas certamente seguríssimas e bem resolvidas que não precisam da popularidade fácil que tais comentários geram nos meios de comunicação. Contudo, não é conveniente subestimar este movimento debaixo de uma argumentação tão frágil. Analisemos mais de perto o problema.

A nova direita e o marxismo cultural

Jordan Peterson estará em Portugal e espera-se uma adesão interessante às suas intervenções públicas. Peterson não é um ente isolado, mas o símbolo de uma mentalidade que crescente em todo o mundo. Podem orbitar em seu redor alguns fundamentalistas com uma mentalidade mais ou menos totalitária. Mas qualquer pensador pode ser vítima dessa instrumentalização por parte dos seus seguidores.

Primeiramente, importa reconhecer que Jordan Peterson possui uma comunicação invejável, eloquente, elegante e nivelada. Pensa e dialoga nos limites de uma educação que não raras vezes falta à nova direita (que é um movimento crescente, diversificado, muito complexo e difícil de abordar num só lance).

Jordan Peterson não é católico, mas reconhece, no mínimo, o valor sociológico da religião. O seu pensamento tem valor intrínseco. A defesa dos valores do trabalho, da tradição, da diferença ontológica entre homens e mulheres, e a importância da responsabilidade individual são aspetos muitos positivos que até há pouco tempo eram silenciados.

Tal silêncio remete para o movimento cultural que campeia na contemporaneidade por ação do marxismo revisionista desde a segunda metade do século XX. Este atua já não tanto nas estruturas visíveis de poder, mas na influência nos círculos de pensamento – o que os marxistas revisionistas teorizaram (como muita esperteza, diga-se) foi um movimento cultural.

O novo helenismo – terreno promissor para a evangelização

Os ouvintes e seguidores de Peterson também não são católicos fervorosos (pontualmente também os há). Estamos a falar de pessoas que possuem um substrato de ideias e convicções razoáveis e ordenadas, ainda antes de terem recebido a fé.

Não canonizo o pensamento de Jordan Peterson e dos seus seguidores. Há aspetos a purificar. Mas, no enlouquecido mundo pós-moderno, toda sanidade e lucidez que floresça deve ser valorizada. Nisto há algo semelhante com as relações entre o cristianismo e a filosofia.

Os cristãos não aceitaram a filosofia grega de forma acrítica. Havia correntes a repudiar. Outras, porém, a um nível estritamente natural e racional, tinham notáveis intuições consentâneas com a Verdade revelada em Cristo. Destacam-se o platonismo e o aristotelismo.

Nem tudo o que Platão e Aristóteles disseram foi repetido! Platão acreditava na preexistência das almas e Aristóteles pensava que o mundo era eterno (para o catolicismo, a alma de cada pessoa só é criada quando o ser humano é concebido; o mundo é contingente: teve um princípio e terá um fim) … E por aí vai. No contexto pagão, com as suas inúmeras loucuras filosóficas (sofística, ceticismo), o facto de terem aparecido homens com as “ideias no sítio” foi valorizado pelos cristãos.

Apenas com a luz da razão vislumbraram algo da estrutura da realidade. Imagine-se onde poderia ter chegado Platão e Aristóteles se fossem cristãos! Por isso, Agostinho e Tomás de Aquino quiseram aproveitar o melhor que havia nos clássicos.

Também hoje emerge um novo perípato (nome que se dava à escola filosófica que seguia Aristóteles) formado por pessoas que apenas com a luz natural da razão (e muitas vezes sem fé) se têm aproximado de muitas das convicções que o catolicismo já sabe pela luz sobrenatural da Revelação. Verdades que foram desacreditadas, que se julgavam ultrapassadas e que até alguns eclesiásticos calaram por condescendência com o mundo.

Peterson, Aristóteles e o cristianismo?

Também nós não temos de concordar com todo o pensamento das correntes emergentes da linha de Peterson. Contudo, aproveitemos a inteligência com que redescobriram e defendem aquilo que nós, por vergonha, deixamos de anunciar há algumas décadas.  Este é um território fascinante por explorar pela sua interessante afinidade com a fé cristã. O cristianismo precisa de ser novamente gerador de cultura e estar à altura de desafiar com desassombro profético o wokismo, a ideologia de género, a cultura da morte e a autocomiseração europeia.

Não subestimemos a o movimento Peterson. Estudemos os seus poros de permeabilidade ao Evangelho e não lutemos contra aqueles a quem falta pouco para serem cristãos. Uma racionalidade ordenada é o átrio que precede a adesão a Cristo.

Afonso Silveira

 

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