Desafios para as vocações sacerdotais

Pela equipa formadora

  • O primeiro desafio é “estar em saída”.

O sentido de pertença comunitário é, como sabemos, fundamental à sementeira e incremento de caminhos vocacionais. “Estar em saída” livra-nos da tendência de estarmos sempre à espera de que nos enviem candidatos.

 

  • O segundo desafio é o da escuta que leve a um verdadeiro conhecimento dos jovens concretos.

Que meios ter em conta para proporcionar a capacidade dos jovens se expressarem, de modo que isso dê início ou dê andamento a um processo vocacional?

O sentido da escuta é urgente. Hoje, a pastoral vocacional precisa de passar por uma escuta recíproca, num encontro de um “eu” com um “tu” na sua verdade e na sua história. É com essa escuta recíproca que poderemos fazer o despertar das vocações inerentes à nossa identidade batismal. Uma pastoral vocacional centrada nesta escuta parece ser uma ideia fundamental.

 

  • O desafio do acompanhamento.

O acompanhamento deverá passar por não estarmos à espera de que venham ter connosco, mas com a capacidade de ir ao seu encontro para lhes proporcionarmos o encontro com Cristo. Cada vez mais vemos o acompanhamento personalizado como imprescindível para a revitalização da Igreja em relação aos jovens. Como criar redes juvenis onde se vive este processo vocacional muito antes de se despoletar o processo de discernimento para uma vocação específica, sem o descartar de etapas e conteúdos que leva, por vezes, a um certo proselitismo vocacional?

Achamos de grande interesse a ideia de prestar o serviço de acompanhamento aos jovens que manifestem esse desejo. É verdade que não é qualquer pessoa que pode fazer esse trabalho, requer uma sensibilidade e preparação específica. Mas também é verdade que já existem nas dioceses bastantes pessoas que podiam fazê-lo. Isto requer muita dedicação, tempo, continuidade…

  • O desafio dos espaços.

Como pensamos os nossos espaços, as nossas casas de formação, os nossos seminários? Os “cofres fortes” de ontem? Ou como casas abertas, quer para acolher jovens para fazerem a experiência de vida comunitária, ainda que esporádica, como aconteceu no acolhimento de grupos na JMJ, quer para sair ao encontro das realidades onde os jovens se encontram. Como casas de acolhimento e discernimento, por um lado; como “autocaravanas” que levem de uma forma criativa o Evangelho da vocação. As casas de formação surgem, depois, como casas abertas, para acolher quem chega para uma experiência vocacional que surge numa continuidade e concretização do esforço ou dinamismo que se iniciou noutros encontros. Tudo isto motiva a sentir um seminário ou uma casa de formação como que num movimento “cardíaco”: por um lado estamos abertos a acolher e, por outro, disponíveis a sair ao encontro dos jovens. Um Seminário missionário, mais aberto, que queremos com um perfil ou arquitetura pronta a ser sempre andaime que corresponda a uma nova sociedade e a uma mudança de paradigma. No fundo, fazer das nossas casas lares como as “famílias de acolhimento” onde os seus elementos acolhem quem chega para jantar, descansar e tomar o pequeno-almoço e, depois, saem para trabalhar, lançando as redes… ou deixando-se “pescar”

 

  • Outro desafio é o dos modelos da vocação.

Trabalhar mais e melhor a vocação batismal, para que a partir desta se descubram todas as outras. A partir da escuta podem aparecer novas orientações e outras sugestões para outros tipos de atividades que renovem os modelos habituais na pastoral juvenil. Todos admitimos que para suscitar e forma qualquer vocação um ponto capital são os modelos. Uma grande maioria dos jovens, ainda que manifestem gosto de ser cristãos, porém não aparecem nas igrejas, nem nos círculos paroquiais. Os jovens, portanto, não conhecem de perto padres concretos. A ideia de padre para muitos é o estereótipo que vende a sociedade, também acumulado pelos escândalos. É um ponto para pensar: onde e como pode o padre dar-se a conhecer aos jovens? Onde e como os religiosos se podem dar melhor a conhecer? Como é que a vocação matrimonial se pode dar melhor a conhecer? Como partilhar testemunhos significativos?

 

  • Outro desafio é o da linguagem.

É preciso cuidar a linguagem que utilizamos com todos os cristãos, mas de modo particular com os jovens que, fruto da sua época, têm uma linguagem muito própria, à qual não estamos habituados e à qual nem sempre condescendemos. A mudança de paradigma que vivemos na sociedade atual é um facto: precisamos de continuar a propor a pessoa de Cristo e do encontro com Ele com uma linguagem ajustada para que os jovens possam compreender a sua mensagem e colocar a questão vocacional diante da sua Pessoa, como nas histórias vocacionais (bíblicas e outras) que conhecemos. Do tipo de linguagem depende a possibilidade da desmitificação das realidades e conteúdos vocacionais. A experiência do Apóstolo Paulo pode ajudar-nos, na medida em que ele chamou sempre colaboradores na sua missão de espalhar a Boa Nova fora de portas. Criando comunidades novas. Mudar ou mudar a linguagem sem desvirtuar o Evangelho. Pode acontecer, também, que se não melhorarmos a linguagem o Evangelho fica fora do “candelabro”.

 

  • Outro desafio é recuperar a prática do empenho sinodal na pastoral das vocações, na relação com todas as outras dimensões da pastoral.

Como pensar, a este nível, a pastoral mais como processo do que como pastoral de sectores? Todos concordamos no grande valor das experiências intensas por parte dos jovens, como na JMJ, e da continuidade que precisam para aproveitar as ditas experiências e poder progredir na maturidade da fé. Que esforços reunir e a partir de que sectores da pastoral da Igreja, para que a riqueza das experiências feitas não se perca? Para não sofrermos a “síndrome do teleférico”: de monte em monte sem fazermos a experiência dos vales. Porque todo o chamamento pelo próprio nome implica a descida aos “sítios planos” onde a vocação se encontra com a missão junto dos destinatários da mesma (cf. Lc 6,12-19). Para além de sectores e secretariados, também os movimentos em geral, em maior ou menor medida, podem dar uma certa continuidade. Outra coisa são as paróquias onde faltam por vezes estruturas mínimas. Achamos que poderia ser importante, neste sentido, que em algumas paróquias ou talvez melhor a nível diocesano, se oferecessem itinerários de formação cristã que integrem vida fraterna, oração e missão. Cientes de que estes grupos podem ser mínimos, de poucos membros, e que exigirão fidelidade no tempo, muita dedicação e muita paciência.

Há dificuldade em fazermos uma pastoral de conjunto, indo ao encontro dos jovens onde eles estão e escutá-los como eles são, não só ou maioritariamente dentro da Igreja. A pastoral de conjunto é urgente: entre agentes pastorais diocesanos e entre pessoas chamadas desde os vários institutos de vida consagrada. O sonho de que haja mais pastoral de conjunto, entre as dioceses e dentro das próprias dioceses, e entre as instituições carismáticas e vocacionais. Todos andamos a preparar coisas de grande sentido vocacional e a cansarmo-nos todos para não chegarmos a todos os jovens. Ou para que os jovens não encontrem sentido vocacional no nosso cansaço, na forma como nos cansamos. 

  •  O desafio da formação.

Muitos falam do desejo de que haja animadores vocacionais nas comunidades, não entendidos como um ministério à parte, mas de uma dimensão do ser pai, mãe, educador, professor, catequista, padre, religiosos, quer dizer, dos chamados que têm a consciência de ser e atuar como “chamantes”. Mas isto é muito raro! “É preciso animar os animadores”. Foi este o primeiro post-it que apareceu num mural dentro de uma jornada de pastoral juvenil em Portugal, há alguns anos atrás, para quebrar o gelo da apatia na expressão dos animadores. Igreja significa comunidade de chamados. A questão vocacional é transversal à pastoral. Mas como fazer que esta convicção seja atrativa? A escuta dos jovens também não escusa a escuta sinodal dos agentes pastorais a respeito das vocações, uma vez que este, por vezes, parece ser um tema “tabu” na animação juvenil. Os agentes pastorais precisam de estar todos sintonizados sobre a gramática da vocação quer no saber perscrutar a vontade de Deus, quer no saber atender as sedes dos jovens. Para percebermos melhor que sementes Deus lançou à terra e procurarmos ajudar que pedras tirar da vida dos jovens para que essas sementes possam germinar. Quantos veem a vida batismal como vida vocacional? A formação e prática dos ministérios laicais podem, também, despoletar caminhos de escuta, de crescimento e de decisão vocacional (Cf. Ef 4,11ss).

Há, já, dioceses que estão a apostar na formação de agentes para o acompanhamento dos jovens.

 

  • O desafio da promoção das vocações como provocação.

Pode acontecer com o acolhimento da vocação sacerdotal o que aconteceu com o acolhimento de jovens estrangeiros em Portugal: o medo e o preconceito de algumas famílias. Depois, as famílias que se atreveram em acolher aperceberam-se do extraordinário que é acolher jovens alegres na diversidade de culturas e línguas, e na convivência da mesma fé em Jesus Cristo. Há muito desconhecimento do que é a vida dos padres e religiosos por causa dos estereótipos provocados pela cultura vigente e, também, pelos escândalos. Neste contexto, não ter medo de propor a vocação a partir do próprio testemunho de vida: no estômago de quem escuta os testemunhos pode parecer, como a Palavra, algo amargo, mas poderá acontecer que da sua “digestão” paciente possa vir a brotar nos lábios aquele “sim” doce para os ouvidos de quem espera profetas e pastores.

 

  • Realçar a dimensão da diaconia na Igreja.

Sem os voluntários, a JMJ não teria sido possível. Não é por acaso que o Santo Padre se reúne no final do programa de uma JMJ com todos os voluntários. Jesus diz que “os últimos serão os primeiros…”. De facto, eles serão os primeiros a ser chamados para realizar a próxima JMJ na Coreia do Sul.

Num tempo em que, falando de Portugal, os voluntários permanentes na sociedade têm mais de 35 anos de idade, como média, é preciso convidar os jovens e incluí-los em oportunidades mais frequentes e até permanentes de serviço aos mais pobres e fragilizados. Não se pode pensar a vocação que não seja por esta porta. O ser enviado para uma tarefa pequena e esporádica poderá ser semente e prova para se ser enviado para uma tarefa grande e permanente. O que o mundo precisa de ver é o poder sagrado que está ao serviço – gratuito e livre – que brota do seguimento de Jesus Cristo.

 

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