No século V a.C., Sócrates pedia aos seus discípulos aquilo que estava esculpido no frontão do templo de Apolo em Delfos: «Homem, conhece-te a ti mesmo». O conhecimento de si é indispensável para percorrer o itinerário da vida interior e humana. É verdade que tal conhecimento nunca é pleno: cada um continua a ser um mistério inclusive para si mesmo e por vezes pode parecer até um enigma com sombras e lados obscuros que não quereria ver e que talvez estigmatize nos outros.
Todavia, é absolutamente necessário conhecer-se a si mesmo, para saber aquilo de que se é capaz, quais são os seus limites e as suas forças, para se ser responsável por si e pelos outros, segundo as impressionantes palavras de Dostoiévski: «Cada um de nós é responsável por tudo e por todos diante de todos, e eu sou mais responsável do que os outros». Trata-se de se conhecer a si próprio como processo de leitura psicológica de si; de conhecer-se para ter de si um juízo justo; de conhecer-se na pertença a uma porção precisa de humanidade.
Cada um de nós existe porque foi gerado, por isso é precedido por pais específicos; existe num tempo e num lugar particulares, por isso veio e vem a cada dia ao mundo, agora e aqui, está no meio dos outros, por isso está em relação com outros. Sim, cada um é chamado a conhecer-se na consciência de ser também tudo aquilo que a vida e os outros fizeram de si, contribuindo para a formação do seu eu. Em tal faixa de relações, conhecer-se a si mesmo comporta um necessário passo preliminar: aderir à realidade, conhecer a sua relação com a história, os outros, o mundo, porque é assim que cada um de nós existe e está envolvido. Muitos caminhos espirituais e psicológicos são estéreis, quando não desumanizadores, porque carecem de adesão à realidade. É extremamente perigoso iniciar o caminho interior sem se sentir no meio dos outros, necessitado dos outros e nunca sem os outros! Quantas derivas existem da parte de pessoas que se isolam, que deixaram de escutar, que vivem só das suas certezas e descobertas.
Neste processo, alguns têm a tendência de confundir o dado espiritual com o psicológico, reduzindo um ao outro. Por outro lado, no longo trabalho de conhecimento de si nem sempre é possível distinguir estas duas dimensões. Sabemos por experiência que erros de espiritualidade podem tornar-se patologias psíquicas (por vezes até com resultados somáticos), e que, vice-versa, patologias psíquicas podem influenciar a espiritualidade. O ser humano é mais unido do que pensamos: corpo, psique e espírito têm uma profunda relação recíproca e a vida é o caminho que tende para a sua unificação. Conhecer-se a si mesmo é, por isso, uma tarefa e um trabalho quotidiano, que requer perscrutar o seu sentir, pensar, falar e agir.
Gonçalo Ávila
1º Ano