Emanar-se

Perguntar-se acerca do sentido da vida é como nos submetermos a uma busca em que só estamos certos daquilo que procuramos quando, finalmente o encontramos (um pouco como a figura dos Apóstolos).
A questão sobre o sentido da vida emerge, pelo facto de as nossas vidas acabarem com a morte (um pouco na via de pensamento de Schopenhauer e Tolstoi). A morte é um facto que assusta o ser humano desde sempre, mas impossível de evitar, visto que, a partir do dia em que nascemos, estamos já a morrer para o mundo e para a vida. Logo, a necessidade de compreender o sentido da nossa existência é fundamental. Na minha opinião pessoal, acho sustentável dizer que Deus nos acompanha na morte. A relação de Deus comigo permanece mesmo na morte, activa, do lado de Deus, passiva, do meu. Recordo S. Paulo aos Romanos 8, 38-39: «Estou convencido de que nem a morte… poderá separar-nos do amor de Deus» a nível pessoal, a morte, não é-me causa de indagação sobre o sentido da vida. Embora reconheça que, para algumas pessoas, essa questão seja fundamental. São precisamente a essas pessoas que me quero dirigir daqui em diante: sejam elas crentes ou não.

Não devemos tentar compreender o sentido que a vida tem, do ponto de vista pessoal, uma vez que a resposta nunca seria satisfatória e nunca iríamos chegar a nenhuma conclusão. Antes, procuremos uma resposta universal, que compreenda o sentido da vida humana em geral. Assim, o sentido da vida tem que ver com a interpretação do relacionamento entre o ser humano e o seu mundo. No entanto, as opiniões sobre esta questão fundamental podem divergir de pessoa para pessoa, bem como variar no decorrer da vida de cada ser humano. Segundo Peter Singer, devemos «olhar para o mundo à nossa volta com olhos de ver». Este “olhar com olhos de ver” (que desmonta toda e qualquer filosofia marxista) consiste, não no olhar sensitivo, mas sim no olhar do entendimento, que tudo vê e tudo alcança através do pensamento que depois se tornará em ato. Desidério Murcho – no seu livro Filosofia em Directo – afirma que «o ser humano é egoísta por natureza, todavia pode alterar isso, precisamente através do seu pensamento que o fará reflectir sobre o Bem Agir e que permitirá que seja uma pessoa melhor.»

– Porque queres uma casa? Perguntei-me.

– Para estar bem acomodado. Respondi-me.

– Porque queres estar bem acomodado? Perguntei-me, uma vez mais.

– Porque quero estar e ser feliz.

Assim, a felicidade é a base dos nossos atos e dos nossos pensamentos. Além disso, a minha felicidade enquanto pessoa passa pelo bem-estar e felicidade daquilo que me rodeia, ou seja, dos outros, do mundo.

Passo a citar, uma vez mais, Desidério Murcho, quando afirma que «Nenhuma vida é em si algo que tenha mais valor do que tem a vida de um símio – excepto se fizermos coisas que nenhum símio pode fazer, como trazer algum valor ao mundo e fazer bem a alguém no mundo», isto é: se não ajudarmos quem está à nossa volta, seremos simples animais que vivem por instinto de sobrevivência e por interesse próprio, logo a nossa vida não faria sentido. Se fizermos algo que os restantes animais estão impossibilitados de fazer, devido à sua incapacidade de raciocinar, estamos a mostrar que somos verdadeiros possuidores de Razão e de Pensamento, e que a nossa vida só terá sentido se ajudarmos os outros e o mundo, visto que Eu sou eles e eles são eu. Somos um só corpo. Precisamos uns dos outros para estarmos felizes: afinal de contas, um «homem solitário ou é um Deus ou é uma besta», já nos dizia Aristóteles.

Precisamos encontrar a razão do nosso viver, ou melhor, o sentido da nossa vida. A vida é preciosa e importante de mais para passarmos por ela sem procedermos à reflexão e ao questionamento. O ser humano vive uma corrida rotineira, quotidiana, sem se perguntar o porquê das coisas, qual a finalidade, qual o seu objetivo, qual o sentido da vida. Temos os passos para a Felicidade nas nossas mãos, basta agir bem e com vontade de ajudar as vidas das pessoas que nos rodeiam. O facto de fazermos bem ao outro traz-nos automaticamente felicidade e bem-estar connosco. Sentimo-nos bem. Se ajudar quem precisa, serei recompensado mais tarde pela vida (uma espécie de relação simbiótica, sem interesses).

Cito, uma vez mais, Desidério Murcho, com uma das frases que devemos ter em conta: «Poderá descobrir, com algum espanto, que não tinha gosto pela vida, porque a vida não tem gosto quando só olhamos para nós e nos esquecemos dos nossos semelhantes».

A vida não tem sentido sem o Outro: Emana-te.

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