Matriz vicentina da caridade

Pe Júlio Rocha elogia originalidade da matriz vicentina da caridade
Conselheiro espiritual da Conferência de São Tomas de Aquino, com 60 anos, sublinha relação de partilha entre o vicentino e o assistido.

A relação de reciprocidade entre o vicentino e os assistidos que estão a seu cargo espelha o sentido da “caridade” e da “compaixão” cristãs que devem inspirar a intervenção sócio caritativa na sociedade atual, sugeriu esta terça feira o conselheiro espiritual da Conferência São Tomás de Aquino, sediada no Seminário Episcopal de Angra que acaba de assinalar 60 anos de atividade ininterrupta.
“A novidade da intervenção vicentina traduz-se no facto de cada vicentino ter a seu cargo pelo menos uma pessoa de quem cuida, mas em que esse cuidar traduz-se num andar lado a lado com o pobre, em que ele precisa de mim mas eu também preciso dele”, disse o Pe Júlio Rocha sublinhando que “é nesta reciprocidade” que está a “mais valia” de intervenção social dos vicentinos que assim “contribuem para uma verdadeira promoção e integração social”.
“O vicentino responsabiliza-se pelo pobre e faz com que ele seja seu companheiro de viagem, sem qualquer distanciamento”, destacou ainda o professor de Teologia Moral.
O modelo de intervenção vicentino vai “muito além” da mera distribuição de bens ou do apoio material porque o vicentino “não usa os seus bens para servir o outro nem se serve do outro para distribuir os seus bens”, destacou ainda o Pe Júlio Rocha.
A relação existente entre eles “vai para além do ter e dar bens materiais” situando-se num plano de amor, e “o pior que pode acontecer a uma pessoa pobre é sentir que ninguém precisa do seu amor”, rematou o sacerdote lembrando, ainda, que hoje a sociedade é “sedentária” mas que a fé “deve ser nómada” e a “nossa habitação chama-se Jesus”.
A Conferência Vicentina de São Tomás de Aquino, sediada no Seminário Episcopal de Angra foi fundada a 20 de Janeiro de 1955 e teve como primeiro presidente o Pe José Garcia, sendo o assistente espiritual o então, ainda sacerdote, José Enes.
A conferência foi fundada pelos alunos do quarto ano de teologia, do Seminário Episcopal, e no dia em que foi constituída, foi também iniciado um costume que até hoje se mantém, o chamado “Pobre dos pobres”.
Esta tradição consiste na visita diária ao Santíssimo Sacramento por dois ou mais confrades que deverão, segundo a acta nº 1, pedir a Deus pela Sociedade de São Vicente de Paulo, pela Santa igreja, por Portugal e pelo Santo Padre.
Volvidos 60 anos esta conferência mantém plena atividade, contando com 17 membros. Todos os seminaristas são vicentinos.
Por trimestre, são feitas mais de 30 assistências. A conferência vive de donativos de vários sacerdotes e outros benfeitores que a auxiliam monetariamente.
Na cerimónia comemorativa deste sexagésimo aniversário o presidente da conferência, Jacob Vasconcelos, seminarista do 5º ano, começou a sua intervenção destacando o papel dos fundadores.
“ À luz da história, contemplamos este feliz acontecimento no âmbito da tão conhecida época de ouro que levou ao florescimento e abertura desta casa a novos ventos do espírito”.
“Fazer memória do passado” é “trazer para o presente os perenes valores que animaram os primeiros membros da nossa conferência”, disse Jacob Vasconcelos, sublinhando que “o convite a fazer o bem sem desfalecer permanece, ainda que tenhamos de descobrir as nuances que os novos contextos nos apresentam” porque “há sempre muito a fazer”.
O seminarista sublinhou, também, a importância dos valores vicentinos na formação do clero.
“A opção preferencial pelos pobres está no âmago da missão da Igreja e da sua doutrina e precisa de encarnar em gestos e situações concretas. Embora cônscio de que há inúmeras formas de o fazer e que a conferência vicentina não esgota o bem que sempre deve ser praticado, penso que cumpre um papel fulcral na formação do futuro presbítero, chamado a uma especial predileção para com aqueles a quem a vida mais castigou”, disse Jacob Vasconcelos.
“Esta sensibilidade nunca pode ser esquecida e é particularmente requerida nestes tempos em que a mentalidade individualista e hedonista nos assola com peculiar intensidade”.
O responsável pela conferência vicentina do Seminário destacou, ainda, o trabalho desenvolvido pela Sociedade de São Vicente de Paulo em todo o mundo. Segundo dados do Pontifício Conselho para os leigos, são cerca de quarenta e sete mil as conferências existentes, sendo constituídas por uma média de quinze a vinte pessoas. Estão presentes em cento e trinta países.
“Penso que estes valores não nos deixam indiferentes e fazem-nos sentir que não estamos sozinhos. Pelo orbe inteiro há quem se dedique, nesta e noutras formas, à meritória “senhora caridade” como gostava de lhe chamar S. Vicente de Paulo”, referiu Jacob Vasconcelos, deixando uma palavra final de agradecimento a todos os benfeitores desta e das outras 14 conferências da ilha Terceira, que também foram convidadas para a sessão solene, tal como o Conselho Central dos vicentinos da ilha Terceira, presidido por Maria Carmelo Alves.
O programa comemorativo começou com uma Eucaristia Solene , na Capela de Nossa Senhora da Natividade, no Seminário , seguida da sessão solene e depois de um jantar, no qual participaram muitos dos assistidos pela conferência. No final do encontro foram distribuídos cabazes a todas as conferências da ilha.

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