Reitor fala em “oportunidade” para “revisitar as origens” da história de uma das “instituições mais prestigiadas” do arquipélago, a Igreja.
A “urgência” de revisitar a memória das “origens da nossa história e da história da Igreja açoriana” levou o Seminário de Angra a associar-se à
Comissão Histórica constituída na diocese para preparar a história da religião nos Açores até 2034 e a fazer do arranque deste projecto o tema das VI Jornadas de Teologia do Seminário Episcopal.
“Num tempo de amnésia e de deterioração da memória é sempre oportuno revisitar as origens da nossa história e da nossa Igreja, uma das instituições mais prestigiadas dos Açores” afirmou o reitor, padre Hélder Miranda Alexandre na sessão inaugural que decorreu esta noite no salão nobre da Câmara Municipal de Angra do Heroísmo, a cidade que também completa 500 anos em 2034.
“A história é mestra de vida mas também é um ato de cultura, que ilumina e enquadra” referiu ainda sublinhando o trabalho “difícil mas necessário dos buscadores de verdade”.
“Urge que se faça um percurso histórico rigoroso e realista do que foi e é a Igreja no arquipélago”, enfatizou, salientando que é importante olhar para o passado para “encorajar o futuro e encontrar a forma mais adequada de ser Igreja no presente e identificar uma pastoral para o homem de hoje”.
O professor catedrático da Universidade de Coimbra, José Pedro Paiva, inaugurou estas jornadas centradas na “memória e na investigação histórica” ao falar sobre os “Contributos para uma história da diocese de Angra: experiências passadas e possibilidades futuras”, a partir da experiência que desenvolveu e coordenou na diocese de Viseu.
O historiador, que dissertou sobre a “importância” destas estruturas diocesanas na compreensão das sociedades, alertou para uma série de factores que importa ter em conta durante o processo de investigação, recolha e tratamento de informação , desde logo porque as fontes “são escassas” e muitas vezes corre-se o risco de transformar estas oportunidades em “momentos laudatórios”.
“A relevância da dimensão religiosa e cristã do arquipélago dos Açores é inequívoca e nos cinco séculos de presença cristã nos Açores, o Cristianismo traçou de modo profundo a identidade açoriana nas suas dinâmicas religiosas, sociais, políticas e até económicas “ referiu José Pedro Paiva.
O Investigador deixou ainda outros alertas nomeadamente a necessidade de se ultrapassar o carácter estritamente confessional de uma história diocesana; reduzi-la a um espaço geográfico arquipelágico; ignorar o diálogo da religião e da Igreja com a sociedade política, social e económica ao longo de cinco séculos ou, ainda, a diversidade de vozes, muitas delas “dissonantes”, que se pronunciaram ao longo destes séculos.
“Os historiadores devem procurar olhar para os objectos que estudam com distanciamento para além das suas convicções, por isso, esta história não deve ser estritamente institucional, devendo incluir o papel dos leigos, atendendo ao diálogo religião e sociedade, política, cultura, população, economia ou arte, numa abordagem holistica”, disse o catedrático de Coimbra.
“Uma boa história de uma diocese deve ter uma espessura problematizante e não se pode limitar a olhar para este território como um tema que temos de descrever; tem que haver análise e uma tentativa séria de compreender os fenómenos históricos que estamos a observar e não ser apenas uma memória de um conjunto de factos que contam o passado” destacou ainda.
O historiador lembrou que este trabalho, que agora começa, não parte do zero- “há muita investigação já feita”- mas é preciso “acrescentar novidade, ir à procura de território ainda não explorado”. Isso requer uma consulta aturada a arquivos locais mas também o recurso a outras fontes, que não se circunscrevem àIgreja ou à realidade local.
“Esta é a gramática analítica que proponho para se fazer uma história que consente uma abordagem historiograficamente atualizada e interessante”, concluiu
A coordenadora regional do projecto, a professora da Universidade dos Açores Susana Goulart Costa lembrou que se trata de olhar para o património imóvel, móvel e intangível das nove ilhas e para a forma como esta igreja açoriana se disse além fronteiras.
“Damos hoje inicio a este projecto que resultará de um casamento feito a partir da sua identidade com a sua diversidade religiosa” disse , agradecendo as “parcerias colaborativas de todos” incluindo Igreja, instituições civis, sociais e políticas,. Deixou ainda um destaque aos apoio financeiros recebidos de várias instituições como o Governo Regional, a Caixa de Crédíto Agricola dos Açores e a Empresa de Eletricidade dos Açores, para além de outras entidades.
“Este projecto precisa de todos vós”, disse ainda.
Esta sexta-feira, 3 de março, a partir das 09h30 locais (menos uma que em Portugal continental), a Biblioteca Pública e Arquivo Luís da Silva Ribeiro acolhe uma mesa redonda sobre “arquivos religiosos” com a participação de Rute Gregório, Nuno Estêvão Ferreira, Carlos Lobão e José Avelino.
Pelas 11h00 os participantes fazem uma visita guiada ao Arquivo da Mitra e, uma hora depois, Luís Carlos do Amaral aborda o tema “Da preservação dos documentos eclesiásticos à construção da memória pessoal e coletiva”.
As VI jornadas de Teologia do Seminário de Angra, com o tema central ‘Igreja dos Açores a caminho dos 500 anos’, vão continuar no dia 24 de março, com o lançamento da Revista Fórum Teológico XXI, V, às 20h00, seguida da conferência ‘Desafios da pastoral diocesana no mundo de hoje’, pelo professor Paolo Asolan, no pequeno auditório do Centro de Congressos de Angra do Heroísmo.
‘Cristianismo, Razão e Crença: a Filosofia na Teologia e na Pastoral da Fé’, pelo professor Eduardo Ferraz da Rosa, e ‘A força evangelizadora da piedade popular’, pelo professor Paolo Asolan, são os temas das conferências do último dia de jornadas, no pequeno auditório do Centro de Congressos de Angra do Heroísmo.
O bispo de Angra, D. Armando Esteves Domingues, encerra, às 12h00, as VI Jornadas de Teologia que vão aflorar os caminhos da fé cristã ritmados pelas vivências de um povo insular, em que “nas veias corre basalto negro e na lembrança vulcões e terramotos”.
“É tempo de conhecer e relançar os tesouros da história e dos desafios que se colocam à Igreja dos Açores, no início de um novo ministério episcopal”.
A Diocese de Angra, criada pelo Papa Paulo III, por meio da Bula «Aequum Reputamus», de 3 de Novembro de 1534, culminará uma história de quinhentos anos, em pouco mais de uma década.