Em que pilar assenta a fé da Igreja Católica e Cristã, para além de Deus? Os que estão mais afastados da Igreja, seja ela espiritual ou física, normalmente nem colocam essa questão, não é do seu interesse. A questão só se torna cativante se for para criar mais um “Código Da Vinci 2” ou algo semelhante. Mas sei que alguns fiéis que frequentam os templos cristãos, mas sobretudo os templos católicos, também pouca ou nenhuma resposta têm para dar a esta questão. Permiti-me, caro(a) leitor(a), que traga, para o meio da nossa conversa, José Saramago, para que possa dar o seu veredicto. Sim, ele que se diz ateu e adverso à Santa Igreja, talvez nos possa ajudar.
Nas primeiras páginas da sua esplendorosa obra as intermitências da morte, ele faz uma catequese importantíssima pela boca do senhor cardeal. Este está preocupado porque naquele país não morre ninguém. Ensina-nos então o seguinte: “Sem morte, ouça-me bem, senhor primeiro ministro, sem morte não há ressurreição e sem ressurreição não há Igreja”. E, permita-me alongar ainda mais: “Dizia o que qualquer católico, e o senhor não é uma exceção, tem obrigação de saber, que sem ressurreição não há Igreja”. Neste contexto, Saramago fala da nossa ressurreição e acrescento: o pilar da Igreja Católica e Cristã, para além de Deus, é a ressurreição de Jesus Cristo e, consequentemente, a nossa.
A verdade da Ressurreição é para muitos confusa. Preferem trocar a Ressurreição de Cristo e a sua própria ressurreição pela reencarnação (preferem acreditar que podem reaparecer como animais, homens ou deuses). Interessante que a reencarnação já foi derrubada pelo famoso filósofo Aristóteles com argumentos muito lógicos, dois séculos antes de Cristo aparecer Ressuscitado. E, ao lado desta troca, temos mais confusões: substitui-se a comunhão com os outros, pelas invejas e maus olhados, como se tivessem algum verdadeiro poder mágico; substituem a confiança em Deus pela segurança do falso tarot e metem à mistura imagens da Santa Virgem Maria ou umas imagens do arcanjo São Miguel; substitui-se a oração (o diálogo sobre a nossa vida com o nosso Pai, por meio de Jesus Cristo, no Espírito Santo) por respirações profundas e yogas, que são espiritualidades que buscam a paz interior, e, por vezes, um Transcendente distante, ao contrário da oração cristã, que nos faz próximos do Deus que já está próximo de nós e que nos quer abraçar e proteger, assim acalmando o nosso coração- a criatura une-se ao Criador, Este que a habita e a ela está unida; mistura-se uns chacras, good vibes e uns cristais “poderosos” com uns crucifixos; e pior, bruxaria com Bíblia; (temos o caso da taróloga Maria Helena e a sua constante venda de imagens de Nossa Senhora desatadora dos nós ao lado das cartas de adivinhação, na SIC), tudo muito familiar, não é? (Meus católicos, ou se beija os pés a Deus ou ao Diabo, os dois não dá! Ou como Jesus diz: “Não podeis servir a dois senhores (…). Não podeis servir a Deus e ao dinheiro” Mateus 6, 24).
Causa para tudo isso? Não se acredita na Ressurreição porque também não são capazes de “dar as razões da nossa fé”, como dizia 1Pe 3, 15. Não há essa capacidade, por que “eu cá tenho a minha fé”. Esta “fé” não permite conhecer mais. Por isso, os católicos são os mais ignorantes acerca da sua fé, no meio de todos os outros ramos cristãos (ortodoxos e protestantes). Quando alguém se demarca com esta frase (“eu cá tenho a minha fé”), lembra-me duas histórias clássicas. Em primeiro, uma fábula de Esopo, A raposa e as uvas, em que a raposa tenta alcançar as uvas e como não consegue atingi-las, despreza-as. Como muitos não têm o alcance da fé no seu todo, porque é difícil, fazem dela um objeto egoísta e não comunitário. A fé que não exige comunidade é uma fé não amadurecida. Olhemos para a psicologia. Ela ensina-nos que a criança vai, progressivamente, fazendo a viragem do eu para o tu-relação. Para isso aprende a andar e a falar: para ir ao encontro de um outro, ou de um conjunto de outros (sociedade-comunidade) e, por fim, ao encontro do Outro (Deus). E em segundo, como se está “orgulhosamente só” dentro de uma caverna, pouco se vê a luz e um mundo novo à espera de ser descoberto. É mais cômodo ver as sombras nas paredes das nossas salas de estar, aprisionados pelos nossos sofás, do que procurar e descobrir coisas novas- estamos perante a Alegoria de Platão, mas só que aplicada aos tempos modernos.
Que jamais se faça intermitências à Ressurreição. Que nunca deixemos de acreditar, nem por períodos nem nunca, na ressurreição de Cristo e na nossa. Que consigamos ser sempre homens e mulheres ressucitados para fazermos ressucitar mais gente. “Se Cristo não ressuscitou é vã a nossa fé” 1Cor15, 14.
António Santos
4º Ano